Governadores querem cobrar planos de saúde por uso da rede pública

Parece-me uma proposta de inconstitucionalidade clarividente. A Constituição Federal é taxativa ao determinar em seu artigo 196 que "a saúde é direito de todos e dever do Estado". Não importa qual a razão que os governantes empreguem para se esquivarem desse dever constitucional (seja a ideologia da "reserva do possível" ou qualquer outra teoria capenga), uma coisa é certa: não é possível cobrar quem quer que seja pelos serviços prestados na rede pública de saúde.

Se o cidadão utiliza-se da rede privada é porque o Estado falhou em seu dever de assegurar a saúde de todos, e o único que deveria ser penalizado por isso é ele mesmo: o ente político inadimplente.

E pior: fico pensando como iriam operacionalizar essa mudança. Usualmente, ao menos que você possua um plano de saúde sem coparticipação (significativamente mais caros), você precisa contribuir com uma parcela em dinheiro toda vez que utilizar algum serviço de saúde pelo plano.

Imagino que, na remota hipótese dessa alteração ser aprovada, uma vez cobrada pelo uso da rede pública, a operadora do plano de saúde irá repassar a coparticipação ao usuário - o qual, ao final da ópera, receberia uma tripla cobrança: 1) primeiramente no que pertine os tributos supostamente destinados à manutenção da rede pública de saúde, mas que, por força da mão divina de alguns, se perdem no meio do caminho; 2) na mensalidade do seu plano de saúde; e, 3) na parcela coparticipação no plano.

Ou seja: o sujeito seria cobrado três vezes por um serviço que é de responsabilidade constitucional do Estado.

Ainda: como eles iriam saber que o paciente atendido na rede pública contratou algum plano privado? Ao menos que eles realizem uma integração dos dados da ANS (improvável), teriam que contar com a boa-fé do usuário.

Mas esse é retrato da política brasileira, pouco importa o partido: britar as regras legais e morais, não tomar conhecimento de seus deveres, e dar continuidade aos seus projetos abjetos de manutenção de Poder, tudo em detrimento dos anseios da população, cujo pacto social ultimamente mais parece um contrato amaldiçoado de adesão.

/rant.

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